segunda-feira, 25 de março de 2019

A GUERRILHA DIGITAL DO BOLSONARISMO

A GUERRILHA DIGITAL DO BOLSONARISMO






Talvez o efeito mais devastador da onda Bolsonaro na cultura brasileira tenha sido a desarticulação da nossa capacidade de conversar. Um conceito mais primário de politica relaciona o termo ao poder do convencimento "mediante a conversação". Se a conversação foi exatamente o alvo da guerrilha digital porque ela via cifras ali onde estava a politica, então agora, nesse começo de governo, estamos colhendo as cinzas da fogueira que queimou a palavra no centro irradiador da esfera pública.
Quando J Habermas publicou o seu seminal livro de sociologia histórica, Mudança Estrutural da Esfera Pública, nos idos da década de 60 do século passado, ele mostrou-se um entusiasta do efeito restaurador, na vida pública e nas liberdades politicas, daquilo que brotava límpido no horizonte da revolução burguesa clássica: Nos cafés parisienses, a prensa diária, o romance, o conto, a literatura subversiva, erótica e sádica, a filosofia critica dos costumes. A rainha de todas, a democracia e o direito Constitucional. Plasmando tudo, a sociedade civil dos livres associados. Foi um salto e tanto na história! 
Ao denegar essa deferência histórica e burguesa à palavra, todavia, os bolsonaristas inauguram a era da impulsão digital para a última batalha no choque de valores. A técnica é usar a transmissão radioativa e tóxica de comandos executáveis para o bem ou para o mal e manter o seguidores patologicamente mobilizados. 
A purificação do verbo é apenas uma encenação de unção de algorítimos cuidadosamente escolhidos. Eis que as dúvidas e os questionamentos são substituídos pela certeza babaca da capacidade nata do chefe orador ou pela verdade sabida de gurus sinistros.
Não há mais púlpito e tampouco audiência presencial para que o velho Habermas veja ainda alguma fagulha de esfera pública brilhar nos olhos dos cidadãos. Navegamos apenas em fluxos radioativos e tóxicos que eliminam a necessidade de ter que me convencer porque você devo agir assim e não assado.  A natureza proposicional da locução que esclarece ao oponente as razões do argumento, dá lugar a uma estérica e estúpida eliminação do outro, seja na queima totalitária da reputação, na dissolução da herança e ou no esbulho puro e simples da convivência. Eliminação essa que o filósofo Hegel já definia como sendo o terror!

Ela é monocrática pois ignora o fato de que ao conversarmos precisamos apresentar bons e fundamentados argumentos sobre aquilo que pretendemos, mas devemos esperar em ato contínuo o retorno daquilo que devemos considerar como contra-argumento. A locução é monológica e enfadonha. O conteúdo é apenas a ansiedade de esperar por um novo comando executável de fala e ação que então, alimenta a minha ânsia de ocupar também todo o espaço de fala do outro. .  

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